Brasil tem imagem externa de ter política disfuncional e ser ingovernável
A ideia de que o Brasil é um país "ingovernável" e de que a política brasileira é "disfuncional" se consolidou como parte importante da imagem internacional do Brasil nos últimos anos. Difundida pelo presidente Jair Bolsonaro em texto distribuído em grupos de WhatsApp, esta interpretação do sistema político do país ganhou força em interpretações estrangeiras especialmente durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff.
Segundo o texto divulgado por Bolsonaro, seu governo está sofrendo pressões de todas as corporações, em todos os Poderes e o país "está disfuncional".
A avaliação internacional de que o sistema político brasileiro não funciona corretamente é mais antiga, entretanto, e foi muito usada pela imprensa internacional para explicar a crise política no país desde o governo de Dilma, o impeachment, as dificuldades de Michel Temer em levar adiante propostas de reformas na economia, e mesmo o processo que levou à eleição de Bolsonaro. Quase sempre que analistas externos fazem uma avaliação mais detalhada da política brasileira, a ideia volta a ganhar força.
Apesar da semelhança no diagnóstico, o contexto da avaliação externa é diferente. Enquanto Bolsonaro parece procurar justificar a falta de avanços em seu governo e tenta conquistar apoio dos seus eleitores, a percepção de analistas internacionais é de que o Brasil deve buscar uma reforma política para aprimorar o sistema e superar dificuldades. O posicionamento externo não é contra a democracia, mas uma indicação da necessidade de melhorar a política do país. Em vez de aumentar o poder do presidente e centralizar a política, a percepção externa é de que o Brasil precisa aprimorar o funcionamento da sua democracia através de reformas, mas é preciso manter divisão de poderes e importantes sistemas de pesos e contrapesos.
Quando a presidente Dilma foi afastada do cargo, por exemplo, grande parte da imprensa de outros países dedicou editoriais à situação política do Brasil. Para a mídia internacional, a questão mais importante não era a disputa sobre a legalidade do impeachment ou a mudança dos governos, mas o fato de que o processo representava o fracasso do modelo político do país.
Textos de opinião de jornais como o New York Times, The Guardian, Le Monde e Financial Times apontavam a existência de graves problemas sistêmicos na política brasileira, diziam que o Brasil precisa de reformas profundas, e que a simples troca de presidente não seria solução para as crises.
"O caso de Dilma expôs algumas das fraquezas do sistema político brasileiro, no qual um presidente tem que fazer acordos com vários partidos políticos, muitos sem ideologia clara. O sistema encoraja a troca de cargos e a corrupção, dizem", explicou uma reportagem no Washington Post.
Segundo o jornal britânico The Guardian, o modelo político brasileiro fracassou e se tornou disfuncional a ponto de a corrupção ser inescapável e um bom governo é constantemente impedido.
Segundo o Financial Times, mesmo com a mudança de governo, o problema que continuava era o do "arranjo político que faz com que o Brasil seja uma das mais fragmentadas e pesadas democracias presidenciais no planeta".
Crítica semelhante foi feita pela revista The Economist, que apontou o Brasil como o país com a política mais fragmentada do mundo, o que deixa o governo disfuncional. O sistema político do Brasil criou uma cacofonia de vozes sem ideologia e precisa ser reformado, explicava a revista em 2017.
"O sistema atual incentiva a diversidade política em detrimento da qualidade", dizia. O sistema, continua, "incentiva a corrupção e enfraquece a ligação entre eleitores e seus representantes".
A ideia de que o Brasil é ingovernável apareceu também em um artigo publicado na revista internacional de diplomacia Foreign Affairs, que avaliou os problemas da política brasileira e tratou das ineficiências da política nacional. Segundo a revista, o sistema político brasileiro é viciado em 'maus governos'.
"O caos que atinge o país é produto não de conduta ilegal individual, mas de uma engenharia política falida. No coração dos problemas brasileiros com corrupção e ineficiência estão as regras que governam a relação entre os poderes Executivo e Legislativo, que encorajam exatamente o tipo de corrupção que o escândalo da Petrobras revelou."
Segundo a Foreign Affairs, para levar o Brasil de volta à solvência política, os brasileiros precisam enfrentar o desafio de fazer uma ampla reforma política e eleitoral para eliminar os incentivos que levam tantos políticos a infringir a lei.
Essa imagem de política que não funciona se consolidou nos últimos anos e é muito negativa para o país enquanto o Brasil tenta construir sua força internacional e seu prestígio em política externa. A ideia de que o Brasil é ingovernável acaba se associando à imagem de país pouco sério, ou a percepção de que se trata de uma nação "decorativa" no mundo, como apontam pesquisas de "nation branding". Segundo estes estudos de imagem no exterior, o Brasil é bem avaliado em sua cultura e sociedade, mas não é bem visto por sua atuação política e econômica. Sem uma reforma que ajude a política a funcionar de fato, e que fortaleça a democracia, vai ser difícil mudar esta imagem.
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