Professor de Harvard avalia risco de invasão do Brasil para salvar Amazônia
A divulgação internacional de notícias sobre aumento do desmatamento da Amazônia e a impressão externa de que o presidente Jair Bolsonaro permite a livre destruição da floresta faz com que seja apenas uma questão de tempo até que as grandes potências mundiais tomem atitudes para tentar impedir a mudança climática da forma como acharem necessário, avalia o professor de relações internacionais Stephen M. Walt, da Universidade de Harvard.
Ao longo do dia, entretanto, a revista mudou o título do artigo para excluir a ideia de "invasão". O mesmo texto passou a ter o título "Who Will Save the Amazon (and How)?" (Quem vai salvar a Amazônia (e como)?).
O texto não é uma defesa de uma ação internacional contra o Brasil, entretanto, mas uma discussão sobre teorias e práticas de relações internacionais tentando entender como funcionam as pressões externas sobre a soberania de países que têm influência sobre o futuro do planeta.
"Para deixar claro: não estou recomendando esse curso de ação agora ou no futuro. Eu estou apenas apontando que o Brasil pode ser um pouco mais vulnerável à pressão do que alguns outros Estados", diz o texto.
O argumento de Walt também vai bem além de teorias da conspiração que circulam há anos sobre interesses econômicos e militares de outros países sobre o território brasileiro –e que são usados pelo governo de Bolsonaro para defender a independência da política do Brasil.
A avaliação dele foca especificamente a questão ambiental e o combate ao aquecimento global, que podem ser vistos como tema central da política internacional do futuro. A avaliação é sobre como Estados podem agir para influenciar uns aos outros em nome da proteção do planeta.
O argumento está alinhado com um outro artigo publicado na imprensa americana recentemente. Um texto publicado pela revista americana The New Republic diz que por conta da destruição da Amazônia o Brasil pode ser tratado como uma ameaça à segurança global maior do que o Irã e a China, tradicionalmente vistos como maior risco da atualidade pelos Estados Unidos.
"Um nível adequado de atenção às mudanças climáticas como uma preocupação urgente de segurança exigiria que os EUA reordenassem suas prioridades. Enquanto a China é um dos maiores emissores de gases de efeito estufa, devemos prestar mais atenção ao que está acontecendo em nosso hemisfério. Em particular, isso significa abordar o perigo mais imediato que estamos enfrentando de um estado que oficialmente é parceiro e do presidente aliado de Trump: o Brasil de Jair Bolsonaro e seu desmatamento acelerado na Amazônia", avalia.
Desde a eleição de Bolsonaro, a atitude dele em relação ao ambiente é vista como problemática pelo resto do mundo e têm sido constantes as declarações externas no sentido de pressionar o Brasil economicamente para que proteja a floresta.
Com uma avaliação mais detalhada do caso, o artigo de Walt começa com a descrição de um fictício cenário futuro, em 2025, quando o governo americano anuncia um ultimato para o Brasil interromper o desmatamento ou sofrerá ataques militares. Apesar de dizer que é um cenário de fantasia, Walt discute os direitos, responsabilidades e obrigações de intervenção em outros países para evitar danos irreversíveis e catastróficos ao ambiente.
O professor explica que a ação internacional muitas vezes depende da força que cada país tem. Ele indica que China, Estados Unidos, Índia, Rússia e Japão são os maiores emissores de gases de efeito estufa do mundo. Esses mesmos países, entretanto, também são potências militares, que se colocam de forma mais segura diante de pressões externas.
"É isso que torna o caso brasileiro mais interessante. O Brasil está de posse de um recurso global crítico –por razões puramente históricas– e sua destruição prejudicaria muitos Estados, se não o planeta inteiro. Ao contrário de Belize ou Burundi, o que o Brasil faz pode ter um grande impacto. Mas o Brasil não é uma verdadeira grande potência e ameaçá-lo com sanções econômicas ou mesmo com o uso da força, se ele se recusar a proteger a floresta tropical, pode ser viável", avalia.
O artigo discute como os países têm direito de proteger seus próprios interesses, mas vê como necessária a discussão sobre repercussões internacionais das ações de um Estado a fim de buscar negociações pacíficas e evitar qualquer tipo de conflito.
"Em um mundo de Estados soberanos, cada um fará o que for necessário para proteger seus interesses. Se as ações de alguns Estados estão pondo em perigo o futuro de todo o resto, a possibilidade de confrontos sérios e possivelmente de conflitos vai aumentar. Isso não torna o uso da força inevitável, mas esforços mais sustentados, enérgicos e imaginativos serão necessários para evitá-lo."
Durante o dia, Bolsonaro mencionou o artigo publicado pela Foreign Policy. Em visita à nova planta de farmoquímica oncológica do Grupo Cristália, em Itapira (SP), Bolsonaro disse que o "Brasil está de braços abertos para os países que quiser explorar por parceria explorar a biodiversidade amazônica."
"Hoje, um grande jornal de fora do Brasil publica uma matéria aventando a possibilidade de uma intervenção militar de fora no Brasil contra o Johnny Bravo que sou eu que está desmatando o Brasil. O que eu quero é uma Amazônia nossa. O que está errado vamos buscar solucionar. Mas ninguém no mundo tem moral de dizer como a gente deve tratar nossas florestas", disse o presidente.
A embaixada do Brasil em Washington enviou no fim do dia uma carta à Foreign Policy respondendo ao artigo de Walt. Leia abaixo o texto completo:
"O artigo publicado por Stephen M. Walt no site da Foreign Policy em 5 de agosto, "Quem vai invadir o Brasil para salvar a Amazônia?", é marcado por falsas premissas e argumentos errôneos que levam a uma interpretação errada das políticas adotadas pelo governo brasileiro. O principal sofisma contido no artigo é que o Brasil não está disposto ou não é capaz de preservar e desenvolver de forma sustentável a Amazônia, e que estados não identificados poderiam fazê-lo. É um exercício irresponsável de retórica arrogante sobre um assunto sério.
A maior floresta tropical do mundo não está localizada no Brasil por acaso. O governo brasileiro tem sido o principal defensor da conservação no mundo, um fato que é apoiado por números, não retórica vazia, as áreas protegidas do Brasil, das quais 80% estão na Amazônia, somam mais de 30% de seu território (960.000 milhas quadradas, ou 2,5 milhões de quilômetros quadrados), e representam mais do que as áreas do Texas, Califórnia, Montana, Novo México, Arizona e Nevada juntas. Além disso, o Brasil impõe requisitos incomparáveis de conservação aos agricultores e pecuaristas da Amazônia, onde os proprietários devem preservar pelo menos 80% da vegetação original em suas propriedades. Além disso, o governo brasileiro e empresas privadas trabalharam juntas para conciliar atividade econômica e conservação, em iniciativas como a moratória da soja na Amazônia e os Termos de Ajustamento de Conduta para a cadeia de produção de carne bovina.
O governo do presidente Bolsonaro reafirmou seu compromisso com o combate ao desmatamento ilegal. Em 1º de agosto, o Brasil anunciou que está fortalecendo os meios para combater a extração de madeira na Amazônia com informações de satélite de maior resolução que permitirão o monitoramento em tempo real. A menção no artigo ao possível uso da força por atores internacionais demonstra desprezo por análise série e falta de conhecimento sobre a posição do Brasil em questões ambientais. De forma simples, nenhum outro país tem controle legal mais rigoroso do desmatamento. As Forças Armadas do Brasil, reconhecidas internacionalmente como militares excepcionais, também estão totalmente envolvidas no esforço de preservação e proteção da floresta.
Aproveito a oportunidade para reiterar que a embaixada continua à disposição para clarificar quaisquer dúvidas e oferecer informações complementares em relação a políticas ambientais do Brasil"
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.