Brasil quer ser líder, mas não tem objetivo diplomático claro, diz Burges
O Brasil quer ter força na mesa de decisões políticas internacionais, mas ainda não pensou sobre o que quer fazer quando alcançar isso. A avaliação é do pesquisador canadense Sean Burges, especialista em diplomacia brasileira.
Segundo ele, o Itamaraty tem um perfil profissional, que não muda com alterações de governo, e é uma parte intrínseca da diplomacia do país. "Mesmo quando o Brasil está vivendo uma séria crise, com incerteza política, o Itamaraty ainda consegue posicionar o Brasil internacionalmente de forma muito eficiente", diz.
Vice-diretor do Centro de Estudos Latino-Americanos da universidade Australian National, Burges é pesquisador sênior do Council on Hemispheric Affairs e autor do livro recém-lançado "Brazil in the World: The International Relations of a South American Giant" ("Brasil no Mundo: As Relações Internacionais de um Gigante Sul-Americano), editado em inglês pela Manchester University Press.
Esta é a terceira e última parte da entrevista do Blog Brasilianismo com Burges, em que ele fala sobre a o jeito brasileiro de fazer diplomacia. Clique aqui para ler a segunda parte da entrevista, em que ele fala sobre o impeachment de Dilma e o que mudou (ou não mudou) na diplomacia brasileira após a troca de governo. Clique aqui para ler a primeira parte da entrevista, em que ele trata das relações entre o Brasil e os EUA após o impeachment de Dilma e a eleição de Donald Trump.
Brasilianismo – Seu livro "Brazil in the World: The International Relations of a South American Giant" fala em um 'jeito brasileiro' de fazer diplomacia. O que significa isso?
Sean Burges – O Brasil tem sete táticas usadas por seus diplomatas para gerar consenso e convencer seus interlocutores. Isso vai desde uma abordagem muito suave a uma linha mais dura de negociação. O Brasil quase nunca tem uma posição independente e única na arena internacional, e quase sempre coletiviza a abordagem, buscando formar uma coalizão em torno dos seus interesses. Além disso, a tradição legalista do Itamaraty é muito importante e usa muito bem a linguagem e a abordagem tecnocrata para despolitizar questões que podem ser muito políticas.
Esse perfil da diplomacia brasileira não muda com alterações de governo, e é uma parte intrínseca do Itamaraty. E é uma grande vantagem. Mesmo quando o Brasil está vivendo uma séria crise, com incerteza política, o Itamaraty ainda consegue posicionar o Brasil internacionalmente de forma muito eficiente.
Além disso, o Brasil tem a tradição de não antagonizar com outros países abertamente. Serra mudou isso um pouco, mas nada radicalmente.
Brasilianismo – Quanto o Brasil está conseguindo avançar seus interesses internacionais em meio à crise, e o que o país ainda tem dificuldade em conquistar?
Sean Burges – O Brasil deve ficar muito feliz com os resultados de política externa alcançados nos últimos 20 anos. O país não estava tentando mudar a ordem política internacional, mas abrir espaço para poder defender seus interesses nessa ordem global. A política externa brasileira busca os mesmos interesses que formam o sistema internacional: paz, segurança, estabilidade e crescimento sustentável. O Brasil tem feito isso.
O Brasil quer ter força na mesa de decisões internacionais. Acho que o problema é que o país não pensou sobre o que quer fazer quando alcançar isso. O Brasil quer ser um líder global, o líder da América do Sul, e a região até aceita isso, mas o Brasil não diz o que quer fazer quando se tornar um líder. O Itamaraty é muito competente em fazer a parte técnica do trabalho internacional, mas parece não haver uma discussão política clara sobre o que fazer agora que o país emergiu na cena global. Falta isso. Falta uma discussão doméstica sobre isso.
Brasilianismo – Com a decisão de Trump de tirar os EUA da Parceria Transpacífico (TPP), e a China ganhando força no comércio global, como fica a relação do Brasil com a China?
Sean Burges – O Brasil não entende a China bem o suficiente para poder ter uma agenda de política externa mais próxima dos seus interesses.
A China tem uma abordagem estratégica muito clara para o Brasil. FHC conta que, nos anos 1990, a China estava trabalhando para crescer sua presença no mundo, e o mundo não conseguiu ver o que estava acontecendo. Ninguém estava pronto para a explosão da economia chinesa, enquanto a China trabalhou duro por seus acordos.
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