Decisão sobre embaixada em Israel gera pressão para a diplomacia brasileira
A eleição de Jair Bolsonaro e a mudança de governo no Brasil estão desenvolvendo um padrão diferente na cobertura sobre o Brasil na mídia internacional. A atenção deixou de ficar concentrada em grandes e tradicionais veículos de imprensa (a maioria com posição crítica ao presidente eleito), e passou a exemplificar pressões e interesses internacionais envolvendo o país.
Além de ganhar destaque em veículos que refletem a disputa comercial e midiática entre Estados Unidos e a China, o país agora é um foco das atenções sobre disputas diplomáticas no Oriente Médio.
O anúncio do presidente eleito, que prometeu levar a embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, é o tema de várias reportagens e análises na imprensa israelense nesta semana. Enquanto isso, por outro lado, a Liga Árabe alertou Bolsonaro em uma carta que a transferência poderia prejudicar as relações com os países árabes.
Um bom resumo do debate é o título de um texto publicado no site da rádio Arutz Sheva (Israel National News): "O Brasil vai ter problemas em transferir sua embaixada?", questiona. Segundo a publicação, Bolsonaro teria admitido aos EUA que cumprir a promessa traria dificuldades para o Brasil, mas o governo americano estaria disposto a ajudar o país. A pressão que aparenta estar sendo elevada indica que sim, problemas existem.
No jornal israelense Haaretz, a vice-ministra de Relações Exteriores soa otimista. "Espero que o Brasil transfira a embaixada a Jerusalém em janeiro", disse. O Brasil pode servir para reforçar a campanha para levar mais países a transferir a embaixada em Israel.
Apesar de celebrar o alinhamento do novo governo do Brasil, a imprensa israelense também vê a pressão comercial sobre o país. Sites como o Jerusalem Post e o The Times of Israel dão destaque à carta do secretário-geral da Liga Árabe, Ahmed Aboul-Gheit, entregue ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil, criticando a transferência. A carta diz ainda que a decisão de mudar a embaixada seria considerada uma violação da lei internacional e das resoluções do Conselho de Segurança da ONU.
Segundo a agência Reuters, embaixadores de nações árabes se reunirão em Brasília para discutir o plano de Bolsonaro de transferir a embaixada de Tel Aviv e reconhecer que Jerusalém é a capital de Israel. "O mundo árabe tem muito respeito pelo Brasil e queremos não apenas manter as relações, mas também melhorá-las e diversificá-las. Mas a intenção de transferir a embaixada para Jerusalém pode prejudicá-las", disse um diplomata à agência. O Brasil é um dos maiores exportadores de carne halal do mundo e esse comércio pode enfrentar problemas se Bolsonaro irritar os países árabes com a transferência da embaixada.
Além da transferência da embaixada, a pressão tem sido amplificada em torno da mudança brasileira mais ampla em política externa.
A mídia israelense tem visto com bons olhos o tom usado pelo novo governo em política internacional. O site Breaking Israel News (que diz publicar "notícias mais recentes com perspectiva bíblica") celebrou a "vitória simbólica" no voto "sem precedentes" do Brasil ao lado de Israel e EUA contra o Hamas na Assembleia Geral da ONU.
O site cita Eduardo Bolsonaro, filho do presidente eleito, que declarou que o Brasil não vai mais ser um "anão diplomático". A expressão tem um peso significativo em se tratando de relações entre Brasil e Israel. Ela foi usada originalmente em 2014 pelo porta-voz do Ministério das Relações Exteriores de Israel, Yigal Palmor. O governo de Israel criticava a postura do governo brasileiro de convocar o embaixador em Tel Aviv para consultas, considerando inaceitável a escalada da violência entre Israel e palestinos. Segundo Palmor, "essa é uma demonstração lamentável de por que o Brasil, um gigante econômico e cultural, continua a ser um anão diplomático".
Na disputa atual, a mudança da embaixada e do alinhamento em votações na ONU podem ser interpretados como uma mudança na política externa brasileira, que tradicionalmente apoia uma solução de dois Estados para o conflito israelo-palestino. Isso pode ter impacto comercial imediato, mas pode também ter impacto diplomático mais amplo, fazendo com que o Brasil deixe de ser visto como previsível em seu comportamento em relações internacionais –e previsibilidade é visto como algo positivo, quase essencial, na política externa.
A pressão sentida agora pelo país entre Israel e os países árabes reforça a percepção de que a diplomacia de Bolsonaro põe em risco a projeção do Brasil no mundo –abrindo mão de protagonismo em questões em que o Brasil tem relevância histórica, como o ambiente, e se envolvendo em disputas que podem não trazer recompensas. Israel pode até não mais chamar o país de "anão diplomático", mas o Brasil vai enfrentar dificuldades ao lidar com outros países com quem tem relação comercial forte.
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