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Toda a classe política decepcionou o Brasil, diz editora da 'Economist'

Daniel Buarque

25/04/2016 08h34

Toda a classe política decepcionou o Brasil, diz editora-chefe da

Toda a classe política decepcionou o Brasil, diz editora-chefe da "Economist"

A "Folha de S.Paulo" publicou nesta segunda-feira uma longa entrevista com Zanny Minton Beddoes, editora-chefe da "Economist", em que ela analisa a atual situação do Brasil e comenta a cobertura que a revista faz dos acontecimentos políticos e econômicos no Brasil.

Beddoes defendeu a posição de que o Brasil precisa de novas eleições, pois acredita que não foi só a presidente Dilma Rousseff, mas toda a classe política decepcionou o Brasil. Ela defedne que somente um novo governo, com capacidade de realizar reformas relevantes no sistema do país, podem empurrar o país para fora da crise.

Em editorial publicado há alguma semanas, a revista já havia defendido uma renúncia da presidente Dilma, e criticou o processo de impeachment no Congresso brasileiro. Mesmo assim, já publicou reportagem alegando que dizer que o eventual impeachment não seria equivalente a um golpe de Estado. "No mínimo, seria o reconhecimento de que ela ganhou seu segundo mandato com a falsa promessa de continuar com seus gastos sociais", diz a revista, que avalia a situação econômica e política do país.

Este blog Brasilianismo já tratou das abordagens da "Economist" em relação ao Brasil em outras ocasiões. A publicação é uma das mais influentes do mundo, e costuma servir de referência para discussões a respeito da economia internacional, mas a cobertura dela respeito do Brasil tem a tendência histórica de alternar momentos de expectativa com críticas sempre que o modelo da política econômica do governo se aproxima ou se afasta dos ideais "pró-mercado", segundo a pesquisa de doutorado da socióloga Camila Maria Risso Sales.

Na entrevista à "Folha", Beddoes admitiu o viés da revista, mas rejeitou qualquer radicalismo no posicionamento da publicação. "Sim, somos pró-mercado, pró-liberdade individual, mas isso não significa que não existe um papel a ser cumprido pelo governo. Tudo, de reforma tributária a reforma regulatória… na mesma semana em que tivemos Dilma na capa do Brasil, mostramos na capa da edição dos EUA como o lucro persistente de certas companhias americanas mostra que há competição insuficiente no mercado. Foi muito pró-competição e antiempresas que dominam o mercado. Isso mostra o que somos."

Leia abaixo alguns trechos da entrevista

Clique aqui para ver a entrevista completa na "Folha"

Anos atrás, a "Economist" publicou uma capa com o Cristo Redentor ascendendo, indo para o alto e avante. Quatro anos depois, em 2013, o mesmo Cristo despencava em direção ao chão. Foram previsões equivocadas ou a "Economist" os economistas e o mercado superestimaram o Brasil?

Zanny Minton Beddoes – O Brasil desperdiçou oportunidades. O boom das commodities e o rápido crescimento da China deram grandes oportunidades de exportação ao Brasil. A explosão das commodities com a explosão do crédito foram confundidas com uma transformação estrutural da economia brasileira.

O que realmente estava acontecendo era um boom tradicional. Temo que o governo brasileiro foi condescendente em relação à necessidade de enfrentar dificuldades de um Estado ineficiente, que precisa de regulação e sofre com corrupção.

Por um momento, o Brasil estava florescendo. As pessoas entenderam isso de forma equivocada. Encararam como uma melhora sólida na economia brasileira quando na verdade era um boom das commodities e do acesso ao crédito.

Naquela época não havia nenhum sinal disso?

Falar isso agora é fácil. Mas havia coisas que estavam mudando e melhorando. A melhora da renda, a redução da desigualdade, melhora na educação em especial para os mais pobres, o Bolsa Família… Houve melhoras muito reais no Brasil, mas acho que isso, associado ao bom das commodities e do acesso ao crédito, fez todo o mundo olhar o Brasil lá dentro e aqui fora com óculos com lentes rosa. Nós apenas reparamos no que havia de positivo.

O governo brasileiro tem muita responsabilidade nisso. O governo sabia e sabe que havia um monte de reforma a ser feita. Mas é difícil fazer reformas quando a situação é boa. Agora o Brasil está pagando o preço não apenas pelas reformas que não foram feitas mas por muitos erros na economia.

O que pode ser feito agora para corrigir o cenário e quanto tempo vai levar para o Brasil estar apto a atrair investidores num nível desejável novamente?

O Brasil precisa de um governo efetivo e funcional. Nós escrevemos num editorial algumas semanas atrás dizendo que a presidente precisava renunciar. O Brasil precisa encontrar um jeito de ter um governo eficiente. Do lado econômico, há uma longa lista de reformas a serem feitas.

A situação fiscal é insustentável, mas ainda mais importante é atacar as causas da instabilidade fiscal e de uma economia ineficiente. Reforma dos gastos públicos que são definidos pela Constituição, reforma tributária, reforma da Previdência. Há muito o que fazer.

É possível?

É. Eu acho que dá para ser feito, não é impossível. O Brasil é um desses países em que agora temos o oposto da euforia de antes. Há um pessimismo profundo, nenhum grande investimento e o calor das commodities já passou.

Mas o Brasil tem muitos pontos fortes. Tem um setor agrícola fantástico, um enorme potencial. Acho que, quando um grande programa de reforma começar a ser feito, uma reforma genuína, você poderá ver um revés rápido. A economia está numa recessão muito profunda, a pior em muito tempo.

De fato é uma recessão, mas a inflação está crescendo…

Então, é por isso que, quando houver um governo com credibilidade para fazer uma reforma e que vai agir de fato, as coisas vão melhorar rápido. Vai ser rápido porque tem muito potencial de investimento no Brasil. Muito da dor já passou.

Como você disse, "The Economist" sugeriu que a presidente Dilma deveria renunciar. Mas, semanas depois, a revista apoiou declaradamente eleições gerais. Por que manter a presidente, que ainda não foi indiciada ou denunciada, não é uma possibilidade?

Você leu o editorial. Nele, o argumento que fazemos é que, depois que ela decidiu indicar o seu antecessor [o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva] para ser chefe da Casa Civil, obviamente cruzou a linha em termos de legitimidade. Por sermos céticos em relação ao impeachment, achamos que é melhor para ela renunciar.

Como disse, o Brasil precisa de um governo efetivo e funcional. Se você olha em retrospecto todo o drama, do que o Brasil precisa? Precisa de um governo que seja capaz de colocar de pé reformas necessárias para sair desse buraco econômico. Isso é o melhor para o Brasil.

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Sobre o Autor

Daniel Buarque vive em Londres, onde faz doutorado em relações internacionais pelo King's College London (em parceria com a USP). Jornalista e escritor, fez mestrado sobre a imagem internacional do país pelo Brazil Institute da mesma universidade inglesa. É autor do livro “Brazil, um país do presente - A imagem internacional do ‘país do futuro’” (Alameda Editorial) e do livreto “Brazil Now” da consultoria internacional Hall and Partners, além de outros quatro livros. Escreve regularmente para o UOL e para a Folha de S.Paulo, e trabalhou repórter do G1, do "Valor Econômico" e da própria Folha, além de ter sido editor-executivo do portal Terra e chefe de reportagem da rádio CBN em São Paulo.

Sobre o Blog

O Brasil é citado mais de 200 vezes por dia na mídia internacional. Essas reportagens e análises estrangeiras ajudam a formar o pensamento do resto do mundo a respeito do país, que tem se tornado mais conhecido e se consolidado como um ator global importante. Este blog busca compreender a imagem internacional do Brasil e a importância da reputação global do país a partir o monitoramento de tudo o que se fala sobre ele no resto do mundo, seja na mídia, na academia ou mesmo e conversas na rua. Notícias, comentários, análises, entrevistas e reportagens sobre o Brasil visto de fora.

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