Violência policial é uma das mais fortes imagens do Brasil no exterior
Treinada para "mimar" turistas para tentar diminuir sua má fama no mundo, a polícia brasileira e a violência com que ela age contra os cidadãos é um dos mais fortes estereótipos do país no exterior.
O caso dos cinco jovens fuzilados com mais de cem tiros em Costa Barros, no Subúrbio do Rio, é uma das últimas notícias a reforçar no mundo esta imagem negativa do país e das suas forças de segurança.
O crime foi "o mais recente incidente em uma lista longa e horripilante de assassinatos pela polícia do Rio, que mata mais de que qualquer cidade dos Estados Unidos", diz uma reportagem do jornal inglês "The Guardian", um dos mais críticos à polícia brasileira.
"Quatro policiais militares do Rio de Janeiro foram detidos após suspeitas de que eles mataram cinco jovens negros e mestiços de uma favela e depois manipularam a cena do crime para parecer que estavam se defendendo", explica o "Guardian", tratando o assunto como "execução".
"O Brasil como um todo tem um dos piores registros do mundo em assassinatos de e por policiais. Entre janeiro de 2011 e outubro de 2015, 2.510 pessoas foram mortas em ações da polícia na qual ela alegou se defender – uma média de 1,4 mortes por dia", diz. "A maioria esmagadora das vítimas tende a ser de homens, jovens, negros de comunidades pobres."
Segundo a agência de notícias France Presse, o caso recente foi mais brutal e assustador, mesmo para uma sociedade acostumada com este tipo de violência.
"Mesmo em uma cidade onde mais de três pessoas morrem todos os dias e onde a polícia comete cerca de 16% dos assassinatos, o fuzilamento dos cinco causou choque", diz.
O choque adicional é explicado em parte por uma informação importante destacada pela agência Efe, publicada em veículos internacionais como a rede americana Fox: "Os jovens não pertenciam a nenhuma quadrilha que controla o tráfico de drogas na região e estavam desarmados", diz.
Quase todas as semanas é possível ler relatos na imprensa internacional a respeito das violações aos direitos humanos e a brutalidade dos agentes de segurança, que em contrapartida são vistos como incapazes de diminuir a enorme onda de violência que asssusta a sociedade. Desde o início do levantamento de notícias internacionais sobre o Brasil neste blog Brasilianismo, em março, são frequentes as publicações que falam sobre problemas da polícia do país.
Na mídia internacional, a violência policial foi tratada como "epidemia" pela revista "Foreign Policy". Os policiais já foram associados a "assassinatos em série" pela revista "The Economist". Já foi dito que é uma força policial "rápida no gatilho". Já se comparou a ações de terror, e não são raras as definições como "fora de controle" para a violência policial.
"Todos os anos, a polícia do Brasil é responsável por pelo menos duas mil mortes. As vítimas são registradas como tendo sido 'mortas ao resistir a prisão"', explica uma reportagem de 2014 da "Economist".
"A população brasileira é 50% menor de que a dos EUA, mas sua força policial matou o mesmo número de pessoas nos últimos cinco anos que a polícia americana matou nos últimos 30 anos", diz o site "Think Progress".
Um relatório da ONG Anistia Internacional indica que a polícia brasileira e autoridades ligadas ao governo usam a ideia de legítima defesa como "cortina de fumaça" para encobrir execuções extrajudiciais praticadas por agentes de segurança pública.
O relatório divulgado em diferentes países e em vários idiomas ajuda a reforçar uma imagem internacional de violência no Brasil. Reportagens sobre a questão de segurança pública costumam indicar a falta de segurança e o rotineiro desrespeito aos direitos humanos no país.
"A Polícia Militar do Rio de Janeiro parece seguir uma estratégia de 'atirar primeiro, perguntar depois' e está contribuindo para o aumento do número de homicídios, apesar de raramente ser investigada", diz a apresentação do relatório.
A má fama da polícia brasileira é muito detalhada no livro "Culture Shock! A Survival Guide to Customs and Etiquette: Brazil" (Choque cultural! Um guia de sobrevivência sobre costumes e etiqueta: Brasil), escrito pelo austríaco Volker Poelz e publicado em 2009.
"A polícia brasileira tem uma má reputação, o que infelizmente não é desmerecido. Apesar de haver muitos policiais honestos que trabalham duro, policiais brasileiros estiveram envolvidos com o crime organizado, venda de drogas, lavagem de dinheiro e venda de armas e muitos outros crimes violentos. Como os policiais são praticamente imunes, é quase impossível processar os suspeitos", diz.
Além da forte imagem de violência, o mundo vê o Brasil como um país que tolera a ação brutal da polícia, como se isso fosse capaz de tornar a sociedade mais segura.
O Brasil tem fechado os olhos para a violência policial como uma forma de combater a criminalidade no país, segundo uma longa reportagem publicada pelo jornal americano "The New York Times". Enquanto mortes causadas por policiais criaram protestos nos Estados Unidos, elas são quase sempre aceitas no Brasil como algo normal no policiamento de um país cansado da violência de criminosos, diz a publicação.
O "NYT" compara as 2.212 mortes causadas por policiais no Brasil com 461 mortes causadas por policiais nos EUA no ano de 2013, e ressalta que a população dos EUA é quase 50% maior de que a brasileira. Segundo o jornal, as mortes causadas pela polícia têm aumentado no Rio de Janeiro enquanto o governo trabalha para preparar os Jogos Olímpicos do próximo ano.
"Mas em vez de criar uma reação às mortes causadas pela polícia, um fenômeno oposto tem acontecido em grande parte do Brasil: Propostas de táticas policiais mais fortes têm aparecido", diz, se referindo à "Bancada da Bala" no Congresso brasileiro.
A agência France Presse já tratou desse grave problema do Brasil atual: policiais são os principais suspeitos de um massacre na periferia de São Paulo. Para piorar, diz, parte da população aceita a violência, desde que seja contra "suspeitos de crimes". A AFP fala sobre os "justiceiros" de forma crítica, mas diz que "grande proporção da sociedade brasileira parece feliz em aceitar o estado sem lei, se for direcionado a suspeitos de crimes", explica.
Em uma entrevista concedida ao blog Brasilianismo no início do ano, o pesquisador brasileiro Vinicius Mariano de Carvalho, professor do Instituto Brasil do King's College de Londres e especialista em temas relacionados a segurança pública e violência, falou sobre a dificuldade de explicar a violência do Brasil a estrangeiros. Carvalho tratava do caso da morte de Eduardo de Jesus, de apenas 10 anos de idade, que levou um tiro de fuzil disparado pela polícia do Rio de Janeiro no Complexo do Alemão – o que chamou de "inexplicável".
"É difícil para nós, que falamos no exterior sobre policiamento no Brasil, explicar como funcionam as polícias no Brasil. É difícil fazer entender o que é uma Polícia Militar estadual, uma Polícia Civil, uma Polícia Federal, a Força Nacional, Exército na rua. Temos muitos agentes armados e a coordenação entre eles é muito pequena", explicou.
Para ele, a violência da polícia é um problema, mas é também um reflexo de problemas maiores na sociedade. "A percepção que temos da violência no Brasil é contaminada pelo uso constante de violência pelo estado e pela população. A polícia é um reflexo da sociedade também. Ela não é um caso à parte", disse.
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