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Vazamentos reescrevem história da Lava Jato, diz editor de revista dos EUA

Daniel Buarque

30/06/2019 08h35

A revelação de vazamentos de conversas entre o ex-juiz Sergio Moro e procuradores da Lava Jato está mudando a forma como a Lava Jato é vista no Brasil e no exterior, segundo o editor-chefe da revista Americas Quarterly, Brian Winter. Durante uma entrevista ao podcast First Person, da revista Foreign Policy, Winter analisou o impacto político e jurídico das revelações, e fez críticas à Lava Jato.

"A história está sendo reescrita agora. Muitos que tinham expressado admiração pela Lava Jato agora estão vendo coisas em muitos mais tons de cinza", disse.

O próprio Winter é um dos que viam com admiração a Lava Jato e a atuação de Moro. A revista que ele edita chegou a publicar uma edição em que colocava Moro na capa caracterizado como um dos personagens do filme "Os Caça-Fantasmas", chamando-o de "caça-corruptos".

"Eu ao longo dos anos defendi a Lava Jato e a luta contra a corrupção de forma geral. Todos sabemos o que a corrupção faz com os países. Ela erode a confiança nas instituições e na democracia e tira dinheiro que deveria ser usado para educação e saúde. (…) Mas nada do que estou dizendo justifica essas condutas e práticas reveladas agora", disse.

Winter descreve especificamente o trecho de conversa em que Moro chama o discurso da defesa de Lula de "showzinho". "Não acho que há alguma forma de uma pessoa razoável olhar para essa transcrição e sair pensando que este era um juiz imparcial", disse.

Sérgio Moro lidera equipe de 'caça-corrupção' em capa de revista americana

No podcast, o editor fez um breve resumo da história da Lava Jato, contextualizando o impacto econômico e político da Operação que envolveu "quase todos os partidos políticos brasileiros", o que gerou uma "raiva generalizada" dos brasileiros contra todos os políticos do país.

Segundo ele, "sempre houve suspeitas" de que Moro havia sido mais duro contra Lula do que contra outros suspeitos de envolvimento com corrupção. Entretanto, "na minha opinião, é impossível argumentar que a Lava Jato atuou exclusivamente para atacar o PT e Lula", disse, explicando que mais de uma centena de pessoas, entre políticos de diversos partidos e empresários foram julgados e condenados.

"Mas a questão sobre o fato de eles terem sido mais agressivos ou infringido regras de procedimento judicial e ética para condenar Lula, que eles acreditavam que era o líder de todo o esquema, é uma dúvida que existe há anos. E esta nova evidência revelada pelo Intercept, sugere fortemente uma conduta equivocada"

Winter explica que entrevistou várias vezes Moro, e que conhece bem o ministro da Justiça. Ele argumentou ainda que, ao longo da história foi comum ver casos de investigadores infringirem regras para conseguir lutar contra máfias em várias partes do mundo. "Se você olhar para Moro e os procuradores do caso, não acredito que o objetivo dele fosse condenar Lula ou o PT por odiar a esquerda ou por odiar lula especificamente. O que acho que vemos com essas revelações é que, por razões de lógica da acusação, eles infringiram as regras e fizeram coisas que não deveriam ter sido feitas porque eles estavam atrás de uma pessoa que eles acreditavam que era a peça central de uma organização criminosa."

Segundo o editor, isso se enquadra na questão da importância da opinião pública para a Lava Jato, e está relacionado também à forma como o Brasil está reagindo às revelações. "Há pessoas no Brasil que não se interessam pelos vazamentos. O que importa para muitos brasileiros é que Lula e vários outros políticos que são acusados de corrupção estão presos. Mais do que isso, as pessoas acham que, se Moro infringiu a lei, isso é OK porque os fins justificam os meios", disse, negando que seja a interpretação dele.

Winter disse ainda discordar da narrativa de que o convite de Bolsonaro a Moro para ser ministro tenha sido uma "recompensa" por sua atuação que levou à prisão de Lula. Segundo ele, Moro aceitou ir ao governo para passar reformas para tentar realmente tentar aumentar a luta contra a corrupção. Os vazamentos, entretanto, reforçam a narrativa de que a motivação dele sempre foi política, disse.

Segundo ele, além da mudança da narrativa ligada à Lava Jato, a preocupação agora é que os vazamentos levem a retrocessos na mobilização da luta contra a corrupção no país como um todo. O futuro, disse, vai depender de novos vazamentos e da resposta do sistema judicial brasileiro. "Se tudo for colocado debaixo do tapete, isso é um problema."

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Sobre o Autor

Daniel Buarque vive em Londres, onde faz doutorado em relações internacionais pelo King's College London (em parceria com a USP). Jornalista e escritor, fez mestrado sobre a imagem internacional do país pelo Brazil Institute da mesma universidade inglesa. É autor do livro “Brazil, um país do presente - A imagem internacional do ‘país do futuro’” (Alameda Editorial) e do livreto “Brazil Now” da consultoria internacional Hall and Partners, além de outros quatro livros. Escreve regularmente para o UOL e para a Folha de S.Paulo, e trabalhou repórter do G1, do "Valor Econômico" e da própria Folha, além de ter sido editor-executivo do portal Terra e chefe de reportagem da rádio CBN em São Paulo.

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