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Blog do Brasilianismo

Morte de Marielle oficializa percepção de falência da segurança no Brasil

Daniel Buarque

15/03/2018 11h47

Perfil da vereadora Marielle Franco publicado pelo site 'Ozy' em 2016

O assassinato da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL-RJ) tem o potencial de oficializar aos olhos do resto do mundo a falência da segurança e do próprio funcionamento do Estado do Rio de Janeiro. Em uma escala mais ampla, dado que o Rio é um símbolo internacional do Brasil, pode manchar de forma profunda, talvez definitiva, a percepção do próprio país.

A morte de Marielle repercutiu de forma quase imediata na imprensa internacional. Os principais veículos da mídia estrangeira estão tratando do caso como execução de uma "política em ascensão" que era "especialista em violência" e "forte crítica da polícia".

O caso amplia um estereótipo já consolidado de falta de segurança e de violência policial no Brasil. A divulgação internacional frequente de casos de abusos policiais faz com que esta seja uma das imagens mais marcantes do país aos olhos estrangeiros.

Segundo algumas das primeiras avaliações de estrangeiras sobre o caso, o assassinato da vereadora revela a ascensão do fascismo no país e uma agressão à democracia brasileira.

Segundo reportagem do jornal canadense "The Globe and Mail", o assassinato de Marielle revela a "escalada dramática da crise na segunda maior cidade do Brasil".

Na reportagem sobre seu assassinato, o jornal britânico "The Guardian" descreve Marielle como "uma mulher negra que desafiou a sorte da política do Rio para ter a quinta maior votação entre vereadores quando foi eleita em 2016. Ela era especialista em violência policial e, no sábado, acusou policiais de serem muito agressivos ao revistar moradores de favelas dominadas por quadrilhas", diz.

A agência Associated Press diz que Marielle era conhecida por seu trabalho social em favelas.

Para o editor da revista "Americas Quarterly", Brian Winter, a morte de Marielle representa algo novo e perigoso para a política brasileira.

"O Brasil sofreu com muitas pragas ao longo dos anos, mas violência política geralmente não era uma delas. Este assassinato ainda está sendo investigado, mas levanta questões preocupantes sobre o crescimento do fascismo e de posturas antidemocráticas vistas claramente na vida cotidiana e nas pesquisas", escreveu no Twitter.

O jornalista Gary Duffy, da rede britânica BBC, fez avaliação parecida. "Quando uma política eleita é assassinada por fazer seu trabalho, isso é um ataque à própria democracia", disse, também no Twitter.

Marielle foi descrita como uma política ascendente em um perfil da então candidata a vereadora publicado pelo site americano de jornalismo analítico e reportagens "Ozy" em 2016. A candidatura de Marielle era vista como "a história de uma nova era progressista no Brasil", dizia.

A publicação tem uma pequena seção no topo da reportagem resumindo "por que você deve se importar", e diz que "política do mundo inteiro está sendo dirigida por batalhas sobre identidade".

"O perfil dela é uma raridade nas esferas políticas do Rio e do Brasil –atualmente, seis dos 51 assentos da Câmara do Rio são ocupados por mulheres", dizia o "Ozy".

Na noite de quarta-feira (14), a mesma em que Marielle foi morta, uma inglesa que atua na área de marketing de um canal de TV internacional conversava em um restaurante indiano em Hereford, a cerca de 200 quilômetros de Londres, e falava sobre a curiosidade de conhecer o Brasil, mas também do medo.

"Tenho vontade de ir para o carnaval, mas o Brasil é o único país em que a nossa empresa precisa se preocupar com sistemas especiais de segurança, quando alguém dela viaja para lá", dizia. Naquele momento, já não havia muito argumento para defender o Brasil contra esta imagem associada à violência. Um assassinato brutal de uma política crítica dessa violência só comprova o estado terminal, de falência, da segurança no Brasil.

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Sobre o Autor

Daniel Buarque vive em Londres, onde faz doutorado em relações internacionais pelo King's College London (em parceria com a USP). Jornalista e escritor, fez mestrado sobre a imagem internacional do país pelo Brazil Institute da mesma universidade inglesa. É autor do livro “Brazil, um país do presente - A imagem internacional do ‘país do futuro’” (Alameda Editorial) e do livreto “Brazil Now” da consultoria internacional Hall and Partners, além de outros quatro livros. Escreve regularmente para o UOL e para a Folha de S.Paulo, e trabalhou repórter do G1, do "Valor Econômico" e da própria Folha, além de ter sido editor-executivo do portal Terra e chefe de reportagem da rádio CBN em São Paulo.

Sobre o Blog

O Brasil é citado mais de 200 vezes por dia na mídia internacional. Essas reportagens e análises estrangeiras ajudam a formar o pensamento do resto do mundo a respeito do país, que tem se tornado mais conhecido e se consolidado como um ator global importante. Este blog busca compreender a imagem internacional do Brasil e a importância da reputação global do país a partir o monitoramento de tudo o que se fala sobre ele no resto do mundo, seja na mídia, na academia ou mesmo e conversas na rua. Notícias, comentários, análises, entrevistas e reportagens sobre o Brasil visto de fora.

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