Estudo revela postura crítica da mídia internacional a impeachment de Dilma
A imprensa internacional adotou um tom mais crítico sobre o impeachment de Dilma Rousseff, e cético em relação ao sistema político do país, do que a mídia brasileira. O que já se percebia de forma clara durante o processo que derrubou a presidente petista foi comprovado agora por um estudo publicado pela revista acadêmica "Journalism Practice", comparando a abordagem nacional e a estrangeira sobre o processo.
Segundo a pesquisa, a imprensa brasileira atuou para afirmar a legitimidade do processo de impeachment, enquanto os jornais internacionais foram mais céticos, chamando a atenção para aspectos ocultos que levaram à cassação da presidente.
"Se os jornais brasileiros estavam preocupados em construir a legitimidade do processo, refutando a tese do golpe e apostando na constitucionalidade do assunto, jornais estrangeiros estavam céticos, chamando a atenção para aspectos não ventilados pela imprensa nacional. Nenhum dos jornais estrangeiros analisados considerou que a queda de Dilma foi motivada pelos atos de que ela foi acusada, que por sua vez não carregam peso suficiente para gerar uma punição tão grande", diz o trabalho.
No total, pesquisa avaliou textos editoriais publicados por oito jornais brasileiros e estrangeiros. Foram analisadas as publicações de opinião de "O Estado de São Paulo", "Folha de S. Paulo", "O Globo", "Público" (de Portugal), "El País" (da Espanha), "Le Monde" (da França), "The Guardian" (do Reino Unido" e "The New York Times" (Dos EUA).
"É possível identificar tendências gerais de posicionamento dos jornais analisados, com diferenças marcantes entre o Brasil e países estrangeiros", diz. Segundo o estudo, os editoriais de jornais brasileiros demonstraram "uma preocupação constante em afirmar a legitimidade do processo", com ênfase no ritual constitucional e constante refutação da tese de golpe reivindicada pela ex-presidente.
"Para desconstruir a ideia de que o país estava à beira de um colapso institucional, os jornais insistiram na ideia de que Dilma estava se colocando em posição de vítima, quando, na verdade, 'ela levou o país ao fundo do poço'", como escreveu o editorialista do "Estado de S. Paulo".
Nos jornais internacionais, entretanto, o tom foi outro. "'Le Monde' chamou de 'farsa', um 'jogo político de moralidade duvidosa e zero de inspiração democrática', e enfatizou que tal processo teria pouco chance de acontecer em uma 'democracia mais madura'. 'The Guardian' ressaltou a injustiça perpetrada, e o 'New York Times' apelou ao respeito pelas instituições democráticas. 'El País' foi o único a usar, literalmente, o termo 'golpe', se referindo a um 'golpe baixo no brasil'"
Segundo a pesquisa, a mídia estrangeira destacou, em sua análise, elementos desconsiderados pelos editoriais nacionais. "Um deles foi o nível moral dos juízes de Dilma, muitos dos quais foram acusados de corrupção, enquanto ela mesma nunca havia sido investigada, como apontado por 'El País', 'The Guardian' e 'The New York Times'", diz.
Publicado com o título "Framing of a Brazilian Crisis: Dilma Rousseff's Impeachment in National and International Editorials", o estudo foi realizado pelos pesquisadores Liziane Guazina, da Universidade de Brasilia, Hélder Prior, da Universidade de Beira Interior (Portugal) e Bruno Araújo, da Universidade Federal do Mato Grosso.
Apesar de ter uma análise respeitável, a pesquisa acabou deixando de fora outros posicionamentos importantes na mídia internacional a respeito do impeachment de Dilma. Mesmo que não haja evidência para negar a tese do estudo, seria interessante apontar que muitos dos veículos internacionais que criticaram o impeachment publicaram antes textos defendendo a renúncia da ex-presidente.
Este foi o caso do "Monde" e do "Guardian", que criticaram o processo, mas antes apoiaram a saída da presidente. O mesmo jornal francês que chamou o impeachment de "farsa" publicou um outro polêmico editorial negando que se pudesse chamar o impeachment de golpe de Estado.
O estudo também desconsiderou a revista "The Economist", por exemplo, que não chegou a defender o impeachment, e chamou o processo de "jeitinho" na Constituição, mas que cobrou a renúncia de Dilma e a chamou de "inapta". Outro importante jornal americano, o "Washington Post" chamou o impeachment de "necessário". Deixou de citar ainda o "Wall Street Journal", que teve um tom parecido com o de jornais brasileiros, defendendo a legitimidade do impeachment.
Nada disso nega que o tom geral da mídia estrangeira de fato tenha sido mais crítico e mais cético em relação ao impeachment, e talvez até reforce a tese de que a imprensa internacional adotou uma postura com mais nuances, indicando problemas no processo como um todo, mesmo que isso não deva ser interpretado como uma defesa da ex-presidente.
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