Ação de Temer contra Janot reforça comparação entre Brasil e Venezuela
Dois dias depois de o governo brasileiro condenar a destituição da procuradora-geral da Venezuela, Luisa Ortega, e classificar a medida como "arbitrária e ilegal", o presidente Michel Temer pediu nesta terça-feira (8) a suspeição –e impedimento– do procurador-geral brasileiro, Rodrigo Janot.
Ainda que com pesos diferentes, e com mais instâncias e instituições mais independentes no caso brasileiro, a medida pode reforçar a comparação que alguns analistas estrangeiros fazem entre os dois países em crise, pesando de forma negativa na imagem do Brasil, que pode ser percebido como menos democrático.
A tese de que os dois países, embora em realidades diferentes, vivem situações que podem ser comparáveis, foi defendida recentemente pela professora de política e relações internacionais da Universidade de Aberdeen, na Escócia, Andrea Oelsner.
Para ela, 30 anos depois do fim das várias ditaduras da América do Sul, a região ainda está lutando para consolidar suas instituições democráticas.
"O Brasil e a Venezuela estão lidando com as consequências da corrupção política maciça e, com isso, as promessas não entregues pela democracia. Ambos sofrem não apenas de funcionários corruptos individuais, nem mesmo de governoscorruptos, mas corrupção estrutural permeando seus sistemas políticos de cima para baixo", disse a pesquisadora em artigo publicado no site "The Conversation".
A comparação entre os dois países não é exatamente nova, mas antes costumava ser feita para favorecer a imagem do Brasil, afastando-o da realidade caótica da Venezuela.
Isso ficou evidente em julho, quando o "New York Times" e o "Guardian" trocaram de correspondentes no país, e os jornalistas que saíram do Brasil se despediram com relatos sobre sua experiência no país. Nos dois casos, a Venezuela foi citada como uma referência para que se pensasse os problemas brasileiros como menos graves.
Simon Romero, que era correspondente do "New York Times" no Brasil desde 2011 e deixou o país na semana passada, morou em Caracas antes de se mudar para o Rio de Janeiro. Enquanto o Brasil se afundava em crise e via crescer uma forte polarização política, ele olhava para o que vivenciou na Venezuela, e acabava achando que as coisas não iam tão mal no Brasil.
Relato bem parecido é o de Jonathan Watts, ex-correspondente do jornal britânico "The Guardian" no Brasil, que também deixou o país neste mês. Em seu texto de despedida da América Latina após cinco anos atuando no Brasil, contou que foi apontado pelo ex-presidente venezuelano Hugo Chávez, que o chamou de "gringo".
Apesar das comparações, e da possível aproximação a partir do pedido de Temer contra Janot, os dois países ainda estão claramente em situações diferentes.
Desde a instalação da controversa Assembleia Constituinte da Venezuela, cresceram as críticas à falta de democracia no país, e a destituição da procuradora só aumentou estas vozes contrárias.
O próprio Janot falou sobre o assunto em entrevista à "Folha", alegando que "isso não é uma democracia."
"Lastimável que no século 21 um país trate o Ministério Público dessa maneira. (…) É inconcebível que um órgão de controle sofra esse tipo de retaliação em um país que se diz democrático", disse.
A discussão sobre democracia no Brasil e na Venezuela ganhou espaço de forma irônica no site da rede venezuelana (chavista) Telesur, que acusou Temer de aderir ao lema "faça o que eu digo, não faça o que eu faço".
"Presidente não eleito do Brasil diz que a Venezuela não é uma 'democracia"', diz o título da reportagem.
"Quando você pensa que um presidente imposto pelo Senado e com a popularidade no fundo do poço não tem o conceito de práticas democráticas, o presidente do Brasil declara que a Venezuela vai ser recebida de volta ao Mercosul quando voltar à 'democracia"', diz o texto. Em seguida, a Telesur reforça que o governo da Venezuela realiza frequentemente eleições democráticas, enquanto o próprio Temer não foi eleito para a Presidência.
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