Prisão de Eike é símbolo global de crise e luta contra corrupção no Brasil
"Este homem já foi o mais rico do Brasil. Agora eles está preso acusado de pagar propina".
O título da revista "Time" para a reportagem que narra a prisão do empresário Eike Batista parece ser um breve resumo da oscilação da imagem internacional do Brasil na última década.
Em menos de dez anos, o país que era "bola da vez" no mundo, com economia ascendente, entrou em decadência, enfrenta graves crises políticas e econômicas e lida até mesmo com uma série de problemas em seus presídios. A chamada serve ainda para tratar de um novo símbolo que o país está construindo na mídia do resto do mundo: o de um país que tenta lutar contra a corrupção, e no qual nem os "ricos e poderosos" conseguem mais escapar da Justiça.
Pode parecer exagero usar Eike como um símbolo do que acontece com o país, mas é natural perceber que ele um dia foi o mais rico de um país em ascensão, e agora vive a decadência em um país em crise.
Isso acontece em grande parte porque a mídia internacional costuma usar ícones como Eike para poder apresentar melhor aos leitores no resto do mundo o que acontece com a economia do Brasil, país que ainda é muito pouco compreendido.
Tanto é assim, que Eike é apresentado no livro "Brazil, um País do Presente – A Imagem Internacional do País do Futuro" como uma das faces no resto do mundo da ascensão da reputação brasileira na virada da década. Em 2010, no auge da euforia dos estrangeiros com o potencial financeiro do Brasil, Eike era o ícone da pujança econômica do país.
Ele aparecia com frequência na TV dos Estados Unidos impulsionando a visão positiva da emergência brasileira. Um dos homens mais ricos do mundo, ele era o símbolo do potencial dos investimentos no país e dizia que ia se tornar virar o maior bilionário do planeta.
"O Brasil é uma autoestrada para o crescimento. O país vai continuar crescendo de forma rápida e estável", disse então Eike em entrevista ao "Wall Street Journal Report", programa de TV da rede NBC.
Três anos depois, o mundo descobriu que o otimismo era exagerado. Eike Batista perdeu quase toda sua fortuna, e virou, ainda em 2013, símbolo da decadência do país que tanto prometia economicamente.
Nos últimos anos, enquanto a economia do Brasil afundava na recessão, Eike passou a ser tratado internacionalmente como "ex-bilionário". Nas últimas semanas, foi chamado de "suspeito" e "fugitivo", e agora a notícia da sua prisão foi destaque nos principais veículos de comunicação do mundo.
Apesar da associação estrangeira entre a decadência de Eike e as crises no Brasil, é importante não julgar o país com base apenas no que acontece com o empresário, segundo o jornalista americano Alex Cuadros, autor do livro "Brazillionaires", que trata dos megarricos do Brasil.
"Não julgaria o futuro do Brasil com base no fracasso do Eike", disse Cuadros em entrevista ao blog Brasilianismo, em julho.
"A queda do Eike me parece mais definitiva do que a do Brasil. O Brasil é maior do que ele. Eike tinha muitos fatores dele. Ele não era só um espelho do Brasil. Era um personagem típico dos empresários dos EUA, grandes vendedores de sonhos. A bolha dele se parece com várias bolhas ao longo da história do capitalismo americano, como a de 2000 e a de 2008", disse.
Segundo o jornalista, o grande sucesso do Eike foi se apropriar da euforia que havia sobre as perspectivas econômicas do Brasil.
"Não é coincidência que ele tenha começado a cair na mesma época em que a economia do Brasil. A imagem dele dependia muito da ideia de que o Brasil era uma nova potência mundial."
"Ele foi uma figura muito interessante, pois vendeu a ideia de que era um empresário diferente, que destoava de Sebastião Camargo, Odebrecht e outros que sempre dependeram de capital estatal e contratos públicos. Ele teve muito sucesso vendendo a ideia de que era um 'self-made man'. Mas, no fim, essa narrativa era problemática. Ele era filho de um ex-ministro, se beneficiou dos contatos dele. E levantou dinheiro no mercado privado, mas também buscou contratos com o governo e foi beneficiado com enormes empréstimos do BNDES."
Segundo Cuadros, Eike é uma figura muito contraditória. "A narrativa de sucesso que se cria levaria as pessoas a acreditar que foi so mérito da pessoa que alcançou a riqueza, o que nunca é totalmente verdade. Sempre há relações com o governo, uso do dinheiro para influenciar a política pública. Dessa forma, me pareceu emblemático não só de uma confusão sobre o empreendedorismo no Brasil, mas em outros países, como os EUA", disse.
Um outro ponto importante a tratar sobre a prisão de Eike e sua relação com a imagem do país é a narrativa que o Brasil vem construindo no resto do mundo em relação ao combate à corrupção. A prisão do homem que já foi o mais rico do país, de empresários importantes e de políticos que até alguns anos antes tinham muito poder criam no mundo a imagem de que o país está tentando consertar seu sistema político e econômico.
Este assunto foi tema de uma outra entrevista recente neste blog Brasilianismo. Segundo Brian Winter, editor-chefe da revista "Americas Quarterly" e autor de quatro livros sobre a América do Sul, muito da crise atual no país pode ser reflexo deste acerto na rota rumo a um país em que a Justiça funciona.
"Podemos estar vendo as dores de um avanço qualitativo na aplicação das leis, o que toda democracia precisa enfrentar", disse, citando figuras do Judiciário como "extraordinárias".
Neste sentido é interessante perceber que a notícia da prisão de Eike foi dada no mesmo dia em que a ministra Cármen Lúcia, do STF, homologou novas delações na Operação Lava Jato, o que pode fortalecer a luta contra a corrupção e a imagem internacional do Brasil como um país que tenta se tornar menos corrupto.
Tanto é assim que o relatório anual da ONG Transparência Internacional sobre percepções de corrupção no mundo diz que 2016 foi um bom ano para a luta contra a corrupção no Brasil.
"Os ricos e poderosos foram colocados cada vez mais sob os holofotes", diz o texto, elogiando os avanços da investigação sobre corrupção na Petrobras.
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