Kenneth Maxwell: Políticos brasileiros vivem em uma bolha e ignoram o país
O brasilianista e historiador britânico Kenneth Maxwell prefere evitar fatalismos ao analisar as crises política e econômica no país. "O Brasil não vai acabar", disse, em entrevista à revista "Época" durante visita ao Brasil para participar da Flip.
Sua avaliação vê nos problemas atuais uma crise existencial no Brasil. "É uma crise existencial porque o que está em crise são os fundamentos da representação política. É uma crise muito profunda e é difícil avistar uma saída", disse à revista.
O pesquisador criticou os políticos brasileiros que "vivem em uma bolha" em Brasília, e agem de forma egoísta sem pensar no resto do país. Isso é aparente no governo interino de Michel Temer e nas incertezas vividas pelo país em um processo que, segundo ele, pode até trazer de volta ao poder a presidente afastada, Dilma Rousseff.
"As instituições democráticas se desligaram da população."
Maxwell ressalta que a situação do Brasil passa por fluxos constantes que se alternam entre esperança e desespero, e que é importante ter uma perspectiva de mais longo prazo.
"Quando as pessoas escrevem livros sobre o Brasil, eu as aconselho a não escrever que o Brasil está em ascensão ou em queda. Porque, senão, o livro ficará desatualizado quando for publicado. O Brasil tem de abandonar essas ideias de que é o país do futuro ou o país que nunca vai para a frente. O Brasil é um país grande e complicado e tem um sistema político muito complexo, com vários interesses envolvidos. O Brasil vai sobreviver a este momento de depressão", disse.
O próprio historiador já havia ressaltado recentemente, em entrevista à BBC Brasil, que o mau momento atual do Brasil estava afetando a imagem internacional do país, mas já indicava que as coisas não eram tão ruins quanto pareciam..
"A imagem internacional do Brasil não poderia estar pior. A imagem do Brasil tende a ir da euforia às previsões de desastre. Na realidade, nunca é tão boa ou tão ruim, e o Brasil é um país vasto onde algumas coisas funcionam bem e onde há uma esperança permanente no futuro. Mas atualmente é muito difícil encontrar algo positivo em meio ao tsunami de notícias ruins", disse então.
Veja abaixo trechos da entrevista de do brasilianista à "Época"
Pergunta – Que avaliação o senhor faz da crise que o Brasil vive?
Kenneth Maxwell – É uma crise existencial do regime que emergiu no fim da ditadura militar, da Nova República. A questão é se a Nova República pode sobreviver sem uma reforma nobre das instituições. É muito difícil saber se as reformas vão acontecer quando há políticos de quase todos os partidos envolvidos em casos de corrupção. É uma crise existencial porque o que está em crise são os fundamentos da representação política. É uma crise muito profunda e é difícil avistar uma saída. E o cenário internacional também não é bom para o Brasil.
Pergunta – Como o Brasil chegou a esse ponto?
Maxwell – É difícil responder. Seria fácil botar a culpa no PT. Mas a corrupção existe há muito tempo. Houve muita corrupção na ditadura militar, mas também antes e depois. É um exagero dizer que a corrupção é toda do PT. O Partido dos Trabalhadores foi a grande esperança da esquerda moderada, mas sucumbiu à corrupção – o que é uma pena não só para o Brasil. Mas a corrupção não é coisa só do PT. O PSDB de São Paulo também está envolvido. Aécio Neves está envolvido com corrupção em Minas Gerais. Toda Brasília está envolvida nisso. A corrupção é interpartidária. E também é preciso resolver a questão dos dois presidentes. Não sabemos se o impeachment de Dilma Rousseff terá êxito, porque há senadores indecisos. É possível que Dilma volte ao poder. Parece inacreditável, mas os políticos brasileiros só olham para suas vantagens.
Pergunta – O governo Temer é bastante impopular e já perdeu três ministros, todos acusados de corrupção. Ainda assim, o presidente interino sempre repete que a batalha contra a corrupção é uma de suas bandeiras. O que podemos esperar do governo Temer?
Maxwell – Ele diz que vai assegurar o Bolsa Família, mas vamos ver… É inacreditável que o presidente interino tenha nomeado um gabinete sem mulheres. Estamos no século XXI e no governo Temer não há mulheres ou negros! É inacreditável! É o típico comportamento de Brasília, que vive dentro de uma bolha e não pensa no resto do país. Os homens fortes de Temer são Henrique Meirelles [ministro da Fazenda] e José Serra [ministro das Relações Exteriores], e ambos têm mais de 70 anos! Não há gente jovem na política brasileira. No Brasil, a política ainda é um jogo de homens velhos. Personagens do regime militar como José Sarney ainda estão por aí! Mas isso não é um problema só do Brasil. É uma situação que se repete em todo o mundo democrático. As instituições democráticas se desligaram da população.
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