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Blog do Brasilianismo

Espionagem dos EUA reforça imagem de Brasil como ‘potência global’

Daniel Buarque

04/07/2015 10h54

Desenho publicado pelo site do WikiLeaks junto com os dados de espionagem dos EUA no Brasil

Desenho publicado pelo site do WikiLeaks junto com os dados de espionagem dos EUA no Brasil

Tem um besouro gigante no Palácio do Planalto.

A imagem foi publicada pelo site de vazamento de informações sigilosas WikiLeaks e faz referência a escutas clandestinas da Agência de Nacional de Segurança dos EUA no governo brasileiro ('bug', em inglês, palavra que pode ser traduzida como grampo telefônico e como besouro). O WikiLeaks publicou neste sábado (4) uma lista de brasileiros que se tornaram alvo de espionagem e tiveram seus telefones grampeados . Segundo o WikiLeaks, 29 telefones de membros do governo foram monitorados pela espionagem americana.

A revelação não é exatamente nova, mas traz detalhes sobre os nomes dos alvos de espionagem e aconteceu poucos dias depois de a presidente Dilma Rousseff se encontrar com o líder norte-americano Barack Obama na última semana, em Washington, DC. e dizer que confiava nos EUA.

Veio também poucos dias depois de Obama declarar em entrevista que os EUA veem o Brasil como uma "potência global", e não como um país apenas com influência regional. Apesar de a declaração ter sido em ampla medida interpretada como um mero aceno de simpatia do presidente americano pelo Brasil (inclusive por este blog Brasilianismo), a revelação das informações sobre espionagem de lideranças brasileiras pelos Estados Unidos reforçam a teoria: os EUA realmente devem considerar o Brasil importante a ponto de precisar espionar o governo do país de quem sempre se declara parceiro e amigo.

Se o Brasil fosse uma "potência regional" sem importância, talvez os americanos não tivessem se dado o trabalho de espionar o governo. Mas com grandes poderes vêm grandes responsabilidades e grandes preocupações internacionais. Se o Brasil realmente aspira a ser uma verdadeira potência internacional, ele vai ser sempre visto com suspeitas até mesmo pelo amigo que é a maior potência global, para que nunca possa se tornar uma ameaça.

É difícil imaginar que a atual revelação vá criar novos problemas para a relação entre o Brasil e os EUA. As atuais crises financeira e política do país fazem com que o governo Dilma dependa de apoio dos norte-americanos, tanto que ela deixou de lado a briga anterior durante a viagem recente.

É de se esperar também que os dois presidentes tenham tocado nesse assunto em conversa sigilosa. Mesmo que seja impossível saber o que foi acertado entre eles, é possível que os americanos tenham deixado claro que vão ajudar o Brasil, que querem que o país seja a tal "potência", mas que está de olho, e que o Brasil precisa continuar alinhado a seus interesses – tudo especulação, claro, mas que pode fazer sentido.

A imagem do Brasil na diplomacia americana é de um amigo de longa data, mas que às vezes passa um certo tempo distante, e que pode assumir temporariamente ideias que contrastam com a dos EUA. A atual espionagem parece uma forma de os americanos perceberem que o "amigo" tem vontade de ser uma potência e que tem potencial para crescer. Assim, eles preferem criar uma maior aproximação, mas manter os olhos (e os ouvidos espiões) bem abertos para o que este "amigo" anda fazendo, mesmo que seja uma abordagem um tanto ilegal.

Por mais absurdo que seja saber que o país está sendo espionado, esta espionagem ajuda a confirmar que os americanos realmente reconhecem que o Brasil pelo menos tem potencial de se tornar uma grande força global.  E, se o Brasil realmente tem tanta vontade de ser uma "potência global", tem que estar preparado para todo o jogo sujo que há por trás dos diplomáticos apertos de mão.

Veja a lista completa de membros do governo vigiados pelos EUA no site do WikiLeaks

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Sobre o Autor

Daniel Buarque vive em Londres, onde faz doutorado em relações internacionais pelo King's College London (em parceria com a USP). Jornalista e escritor, fez mestrado sobre a imagem internacional do país pelo Brazil Institute da mesma universidade inglesa. É autor do livro “Brazil, um país do presente - A imagem internacional do ‘país do futuro’” (Alameda Editorial) e do livreto “Brazil Now” da consultoria internacional Hall and Partners, além de outros quatro livros. Escreve regularmente para o UOL e para a Folha de S.Paulo, e trabalhou repórter do G1, do "Valor Econômico" e da própria Folha, além de ter sido editor-executivo do portal Terra e chefe de reportagem da rádio CBN em São Paulo.

Sobre o Blog

O Brasil é citado mais de 200 vezes por dia na mídia internacional. Essas reportagens e análises estrangeiras ajudam a formar o pensamento do resto do mundo a respeito do país, que tem se tornado mais conhecido e se consolidado como um ator global importante. Este blog busca compreender a imagem internacional do Brasil e a importância da reputação global do país a partir o monitoramento de tudo o que se fala sobre ele no resto do mundo, seja na mídia, na academia ou mesmo e conversas na rua. Notícias, comentários, análises, entrevistas e reportagens sobre o Brasil visto de fora.

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